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A Rivalidade Que Mudou a Computação: Como Bill Gates Salvou a Apple (e Depois Quase a Destruiu)

Em 1984, Bill Gates fez uma previsão ousada que jamais seria cumprida. Ele não enxergava a Microsoft e a Apple como inimigas. Pelo contrário: Gates acreditava que o Macintosh era o futuro da computação. O que ninguém imaginava era que, apenas uma década depois, a Microsoft se tornaria a verdadeira inimiga da Apple — e que, paradoxalmente, Gates seria o único capaz de salvá-la da falência.

Esta é a história de como um acerto de contas entre duas gigantes da tecnologia quase destruiu uma delas, e como um investimento de US$ 150 milhões mudou o curso da história do Vale do Silício.

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O Dia em Que Bill Gates Defendia o Macintosh

Em novembro de 1984, a revista BusinessWeek estampou na capa uma foto de um jovem Bill Gates com um sorriso confiante. Na entrevista, o fundador da Microsoft fez uma declaração que parecia vinda de um de seus maiores fãs:

“A próxima geração de softwares interessantes será feita no Macintosh, não no IBM PC.”

Na época, essa afirmação tinha peso. A Microsoft não era ainda a gigante dos sistemas operacionais que conhecemos hoje. A empresa ganhava quase metade de sua receita vendendo software para a plataforma Apple. Gates havia compreendido algo crucial: a interface gráfica do usuário (GUI) era o futuro, e o Macintosh era a encarnação dessa revolução.

A Apple, por sua vez, havia apostado tudo em derrotar a IBM. O comercial distópico de Ridley Scott, transmitido apenas uma vez durante o Super Bowl XXIII em janeiro de 1984, retratava a IBM como “Big Brother” — o vilão do romance de George Orwell — e o Macintosh como o libertador. Em Cupertino, os executivos dormiam sonhando com a queda da empresa de Armonk. Não havia espaço em suas mentes para enxergar o perigo se formando silenciosamente em Redmond, Washington.

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O Acordo Que Entregou o Mac à Microsoft

Tudo mudou em 1985, com a saída de Steve Jobs da Apple. Jobs havia sido o visionário, o comerciante de sonhos. Seu sucessor, John Sculley, era um homem prático, pragmático — mas talvez excessivamente confiante na Microsoft.

Sculley assinou um acordo que definiria os próximos 13 anos de rivalidade. Concedeu à Microsoft uma licença perpétua, mundial e livre de royalties para usar elementos visuais do Macintosh em seus sistemas futuros. A intenção era garantir que a Microsoft continuasse desenvolvendo software para o Mac. O resultado foi o oposto.

Com este documento assinado, a Microsoft tinha o que precisava: a bênção legal para transformar a interface gráfica do Macintosh em Windows. O que havia começado como uma parceria estratégica se converteu em expropriação intelectual.

Em 1988, a Apple decidiu lutar. A empresa processou a Microsoft, alegando que o Windows 2.03 infringia seus direitos autorais e plagiava a “aparência e funcionalidade” do Macintosh. Era uma batalha David contra Golias — mas dessa vez, David estava do lado errado da lei.

A batalha judicial durou anos. Os advogados da Apple apresentaram argumentos técnicos sofisticados. A corte, porém, tinha um documento diante de si: aquele acordo de 1985 que Sculley havia assinado. Em 1994, quando a Suprema Corte dos EUA rejeitou o último recurso da Apple, a sentença estava selada. O acordo que deveria proteger a Apple a havia condenado.

Enquanto isso, a Microsoft vencia na rua.

O Golpe Final: Windows 95

Se a derrota legal foi simbólica, a derrota comercial foi catastrófica. Em 1995, a Microsoft lançou o Windows 95, um sistema operacional que trazia a interface gráfica para o mercado de massas. Os números foram brutais:

  • Windows 95: 40 milhões de cópias vendidas em apenas um ano

  • Macintosh: 4,5 milhões de unidades vendidas no mesmo período

A proporção era de 10 para 1. O mercado havia escolhido seu lado.

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Enquanto isso, a Apple desintegrava-se. Em 1996, a empresa acumulava 1 bilhão de dólares em prejuízos. Demitiu 3.800 funcionários — mais de um terço de sua força de trabalho. As perspectivas eram tão sombrias que Steve Jobs, então fora da empresa, diria anos depois que a Apple estava a apenas 90 dias da falência quando ele retornou.

A empresa que havia revolucionado a computação pessoal estava à beira do colapso.

O Resgate Inesperado

Mas então veio o momento que os fãs da Apple preferiam esquecer. Em 6 de agosto de 1997, durante a Macworld Expo em Boston, Steve Jobs (que havia recentemente retornado à Apple) subiu ao palco para fazer um anúncio surpreendente. Na época, havia ainda rancor pelos antigos conflitos, e muitos esperavam que Jobs anunciasse uma aliança com rival como a Sun Microsystems. Em vez disso, Jobs apresentou a Microsoft.

A imagem é icônica: Bill Gates aparecia em uma tela gigante no fundo do palco — como o “Big Brother” do comercial de 1984, mas desta vez não como vilão, mas como salvador.

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A Microsoft estava investindo US$ 150 milhões em ações preferenciais da Apple. Além disso, a empresa se comprometeu a continuar desenvolvendo Microsoft Office para o Mac pelos próximos cinco anos. Era um resgate financeiro e, mais importante ainda, uma validação de credibilidade: se a Microsoft acreditava na Apple, talvez os consumidores também acreditassem.

Jobs, engolindo seu orgulho, dirigiu-se à audiência com uma frase que definia um novo paradigma:

“Temos que deixar de lado a noção de que, para a Apple vencer, a Microsoft tem que perder. Relacionamentos destrutivos não ajudam ninguém. A era de estabelecer isso como uma competição entre Apple e Microsoft acabou.”

O Paradoxo Final

Hoje, quando olhamos para trás, o paradoxo é impressionante: a Microsoft foi tanto o vilão que quase destruiu a Apple quanto o herói que a salvou. O Windows dominou o mercado justamente porque a Microsoft havia copiado, com toda legalidade, a interface do Macintosh. E a Microsoft ajudou a Apple a sobreviver justamente para manter Office como produto diferenciado.

Sem aquele investimento de US$ 150 milhões em 1997, não teríamos:

  • iMac (1998) — que reavivou a marca Apple

  • iPod (2001) — que criou uma nova categoria de produtos

  • iPhone (2007) — que revolucionou a computação móvel

  • iPad (2010) — que inventou o tablet

  • Apple Silicon — a mais recente revolução dos chips da Apple

A ironia histórica é deliciosa: Bill Gates estava certo em 1984. O Macintosh era realmente o futuro da computação. Não porque se tornou dominante no mercado, mas porque seus princípios de design — interface gráfica, facilidade de uso, integração entre hardware e software — definiram como toda a indústria evoluiria.

E a Microsoft, ao mesmo tempo em que “roubava” essa visão e a comercializava de forma agressiva, também financiou a única empresa capaz de continuar inovando com base nessa mesma filosofia.

Conclusão

A história da Apple e Microsoft nos ensina que na tecnologia — como em tantas outras áreas — não há bem e mal absolutos, apenas interesses que se chocam, convergem e se entrechocam novamente. Gates não salvou a Apple por altruísmo. Ele tinha motivos comerciais: queria que Office fosse visto como superior no Mac, queria diversidade no mercado, queria evitar a aparência de monopólio absoluto em um momento em que Microsoft enfrentava escrutínio antitruste.

Mas às vezes, como neste caso, os motivos comerciais e os interesses históricos coincidenciam. E o resultado foi que dois rivais, navegando por seus próprios objetivos, acabaram criando o ecossistema tecnológico que define nossas vidas hoje.

De inimigos a rivais. De rivais a parceiros relutantes. E da parceria relutante, o futuro que Bill Gates havia previsto em 1984.

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